Acordei com um sobressalto. O som era baixo, mas insistente — como unhas raspando madeira. Bonya, minha golden retriever, estava de pé junto à parede do quarto, rosnando e arranhando com uma fúria que eu nunca tinha visto nela.

— “Bonya… o que foi agora?” murmurei, ainda meio sonolenta.

Ela não respondeu, claro. Mas seus olhos estavam fixos num ponto específico da parede — como se algo estivesse ali, escondido, observando.

Vivo sozinha há anos. Desde que o meu marido faleceu, a casa tornou-se silenciosa demais. Os meus filhos raramente visitam. Bonya é a única presença constante, a única alma que ainda partilha os meus dias. E ela nunca se comportou assim. Nunca latiu sem razão. Nunca demonstrou medo.

Naquela manhã, levei-a para a cozinha, tentei distraí-la com comida, mas assim que voltámos ao quarto, ela correu direto para o mesmo ponto. Arranhava, choramingava, como se quisesse cavar através da parede.

Nos dias seguintes, o comportamento repetiu-se. Eu já não dormia. A exaustão misturava-se com uma inquietação crescente. Comecei a ouvir sons à noite — não apenas arranhões, mas sussurros. Baixos, quase imperceptíveis. Como se alguém estivesse a falar do outro lado da parede.

Finalmente, não aguentei mais. Liguei para um técnico.
— “Pode abrir a parede? Só para eu ter certeza de que não há nada estranho ali.”

Ele olhou para mim com desconfiança, mas aceitou. Começou a remover o gesso com cuidado. Bonya estava ao meu lado, tremendo.

Quando ele abriu a secção certa… congelámos.

Atrás da parede, havia um espaço estreito — uma espécie de compartimento escondido. E dentro dele… havia uma pequena cadeira de madeira, uma boneca antiga com olhos de vidro quebrados, e dezenas de folhas de papel coladas às paredes internas. Escritas à mão. Com a mesma frase repetida:

“Ela ainda está aqui.”

O técnico empalideceu.
— “Isto… isto não devia estar aqui.”

Bonya começou a uivar.

E foi aí que a luz do quarto piscou. Uma vez. Duas. E depois apagou-se completamente.

A luz voltou depois de alguns segundos, mas o silêncio que se seguiu foi mais assustador do que a escuridão. O técnico, pálido como cera, juntou as ferramentas e saiu sem dizer uma palavra. Eu fiquei ali, sozinha, com Bonya ainda a tremer ao meu lado e aquele compartimento aberto diante de mim — como uma ferida exposta na pele da casa.

Peguei uma das folhas coladas à parede interna. A caligrafia era irregular, como se tivesse sido escrita por alguém em estado de pânico. A frase repetia-se em todas elas:

“Ela ainda está aqui.”

Mas quem era “ela”? E por que estava escondida atrás da parede do meu quarto?

Naquela noite, decidi dormir na sala. Bonya recusou-se a entrar no quarto, e eu não a forcei. Mas mesmo longe da parede, o sono não veio. A cada vez que fechava os olhos, ouvia o som — arranhões, sussurros, uma respiração lenta e profunda que parecia vir de dentro da casa.

Na manhã seguinte, fui à biblioteca municipal. Precisava saber mais sobre aquela casa. Era antiga, construída nos anos 40, e eu a tinha herdado do meu avô. Nunca pensei muito sobre sua história.

A bibliotecária, uma senhora de cabelos brancos e olhos atentos, ajudou-me a procurar nos arquivos. Depois de alguns minutos, ela parou, franziu o cenho e disse:

— “Essa casa… já esteve envolvida num caso. Em 1952. Uma menina desapareceu lá dentro. Nunca foi encontrada.”

Senti um calafrio.
— “Como se chamava?”

Ela folheou os papéis.
— “Beatriz. Tinha oito anos. Dizem que ela brincava no quarto quando desapareceu. A polícia nunca encontrou sinais de arrombamento. A família mudou-se pouco depois. A casa ficou vazia por décadas.”

Beatriz. O nome ecoou na minha mente como um sussurro. Voltei para casa com o coração acelerado. Entrei no quarto e encarei o compartimento aberto. A boneca ainda estava lá, sentada na cadeira, com os olhos de vidro partidos a olhar para mim.

Bonya começou a rosnar.

Foi então que vi algo novo. Atrás da boneca, uma pequena porta de madeira, quase imperceptível, embutida na parede. Peguei uma lanterna e abri-a com cuidado.

Dentro, havia um corredor estreito, escuro, com paredes de pedra. O ar era frio, úmido, e o cheiro de mofo misturava-se com algo mais… metálico. Sangue seco?

Bonya recusou-se a entrar. Eu avancei sozinha.

No fim do corredor, uma porta de ferro. E gravado nela, com letras tortas e enferrujadas:

“Não acordes o que dorme.”

Be the first to comment

Leave a Reply

Your email address will not be published.


*