Ele viu um arrogante tenente-comandante repreender um veterano frágil: “Saia da frente, velho! Você nunca fez nada que valha a pena lembrar!” Mas quando o almirante entrou e viu o rosto do veterano, empalideceu. Ele não era apenas um velho — ele era o Fantasma Cinco.

A loja da Marinha numa terça-feira é a definição de monotonia. O ar vibra com o som de refrigeradores industriais e o estalo distante e metálico de um leitor de código de barras. Tem um leve cheiro de Cinnabon e cera de chão. É um lugar de rotina, uma pausa no ritmo rígido da vida na base.

Foi ali que o vi pela primeira vez. Não o veterano, mas o oficial.

Tenente-comandante Price.

Você sabe do que estou falando. O uniforme dele era tão impecavelmente passado que parecia que podia cortar vidro. O corte de cabelo de 200 dólares era imaculado. As botas estavam lustradas como um espelho, e dava para perceber que ele dedicava mais tempo a elas do que aos marinheiros mais jovens. Era um homem que se movia pelo mundo como se fosse uma pista de obstáculos criada para seu divertimento pessoal. Em resumo, era um pavão.

E ele estava zangado.

Ele estava parado na fila expressa, batendo o pé, irradiando uma aura de profunda impaciência. A fonte de sua frustração era o homem à sua frente na fila.

O homem era idoso. “Frágil” era a única palavra que o descrevia. Vestia um corta-vento esfarrapado, calças jeans desbotadas e um boné simples com a inscrição “Veterano da Marinha”. Suas mãos, nodosas pela artrite, tremiam enquanto ele tentava contar o troco. Segurava duas latas de sopa Campbell’s e um pequeno pão.

“Vamos lá, velho, vamos embora!” Price disparou, sua voz um estalo áspero e arrogante no corredor silencioso. “Alguns de nós temos empregos de verdade para ir. É só usar o cartão.”

O velho estremeceu, os ombros curvados. Parecia encolher-se, tentando se fazer menor. “Eu… eu sinto muito, filho”, murmurou, com a voz rouca e seca. “Eu só… gosto de usar o dinheiro vivo. Me ajuda a controlar as coisas.”

Uma moeda de vinte e cinco centavos escorregou de seus dedos trêmulos e rolou pelo chão. Ele se abaixou para pegá-la, um movimento doloroso e lento.

Price soltou um suspiro exasperado, alto e teatral. “Inacreditável. É exatamente disso que estou falando. Você está atrasando a fila toda, senhor. Dê licença. Deixe nós, que ainda somos úteis, continuarmos com o nosso dia.”

O velho parou abruptamente, com a mão a meio caminho do chão. A caixa, uma jovem civil, parecia horrorizada. “Senhor, por favor…”

Apenas para fins ilustrativos

“Por favor, o quê?” Price zombou, contornando o velho e jogando seus próprios itens — uma barra de proteína e uma bebida energética — no balcão. “Ele pode esperar. Honestamente, gente como você só vive de uma aposentadoria que provavelmente nem mereceu, ocupando espaço desnecessariamente. Você nunca fez nada que valha a pena lembrar, de qualquer forma!”

Essa foi a frase. Foi nesse momento que a atmosfera mudou.

O velho se levantou, deixando a moeda de vinte e cinco centavos no chão. Ele não parecia zangado. Parecia apenas… cansado. Um cansaço profundo que nada tinha a ver com a sua idade e tudo a ver com a sua alma.

E foi nesse momento, claro, que o Almirante Thompson entrou.

O almirante Thompson era o comandante da base. Ele não era um pavão. Era um bloco de granito, um homem que havia chegado lá com muito esforço. Ele não ostentava sua patente como um privilégio, mas como um fardo que concordara em carregar. Não lhe faltava nada.

O ar na conversa, que segundos antes estava repleto da arrogância estrondosa de Price, de repente pareceu se condensar em um único ponto. Esse ponto era o rosto do Almirante.

Ele não estava olhando para Price. Ele estava olhando para o velho.

O Almirante Thompson não apenas olhou para Silas Kane; ele o encarou, a testa franzida, o olhar percorrendo as feições do velho como se tentasse desvendar um enigma que o atormentava há décadas. Sua mente era um catálogo de fichas, folheando fotos granuladas em preto e branco, em busca de uma correspondência.

O tenente-comandante Price, sempre oportunista, viu sua oportunidade. Sua saudação rígida e bajuladora se impôs de imediato. “Almirante Thompson, senhor! Um prazer inesperado. Apenas mantendo a linha em movimento, senhor. Este… cavalheiro… estava atrasando a—”

“Quieto.”

A palavra não foi um grito. Foi uma navalha. Ela cortou a frase de Price e o deixou boquiaberto.

O almirante Thompson não desviou o olhar de Silas. Deu um passo lento para a frente, e a multidão se abriu ao seu redor como se ele tivesse sua própria força gravitacional.

“Eu te conheço”, disse Thompson, com a voz grave e rouca. Não era uma pergunta. Ele estava desenterrando uma lembrança de um lugar que havia enterrado há muito tempo. “Eu já vi seu rosto. De… muito tempo atrás.”

Silas Kane, que permanecera em silêncio durante todo o discurso de Price, finalmente ergueu o olhar. Seus olhos, da cor de um céu desbotado, encontraram os do Almirante. “Eu estava estacionado aqui, senhor”, disse ele, com a voz rouca e seca. “Há muito tempo.”

“Qual unidade?”, insistiu Thompson, com voz urgente.

Price, desesperado para se reinserir na conversa, zombou. “Senhor, acho que este não é o momento para—”

“Tenente-comandante”, disse Thompson, finalmente virando a cabeça. O olhar em seus olhos era tão frio, tão carregado de uma autoridade repentina e aterradora, que Price recuou fisicamente. “Vou lhe pedir apenas uma vez. Pare. E fique em silêncio.”

O rosto de Price passou de presunçoso para vermelho e, por fim, para um branco pálido e doentio. Ele fechou a boca com um estalo, sua humilhação agora palpável para todos na sala.

Thompson se virou para Silas. “Sua unidade, marinheiro.”

Silas engoliu em seco, seu olhar voltando-se para as sopas. “UDT, senhor. Equipe de Demolição Subaquática. Antes de… antes de ser SEALs.”

“UDT…” Thompson sussurrou. Ele estava claramente procurando por um nome, um arquivo. “Qual equipe?”

Silas fez uma pausa. O silêncio na sala era tão profundo que o zumbido dos refrigeradores soava como um rugido. Quando finalmente falou, sua voz era quase inaudível, mas ecoou pela sala como um dobre de finados.

“…Equipe Fantasma, senhor. Eu era… Fantasma Cinco.”

A reação foi instantânea e violenta. O Almirante Thompson cambaleou para trás meio passo, levando a mão ao balcão em busca de apoio. Seu rosto, momentos antes severo e curioso, agora estava completamente pálido. Parecia que ele tinha acabado de ver, bem, um fantasma.

“Meu Deus”, sussurrou Thompson, com a voz trêmula. “É você. Silas… Silas Kane.”

Price, agora completamente perdido, olhou entre os dois homens. “Senhor? O que é isso? O que é um ‘Ghost Five’? Algum clube de natação antigo?”

O Almirante se voltou para Price. Ele não apenas virou a cabeça; girou o corpo inteiro, e a fúria que emanou dele foi tão intensa que o ar crepitou.

“Clube de natação?”

A voz do Almirante era perigosamente baixa. “Tenente-Comandante Price. O senhor é formado pela Academia. É chefe de departamento em uma embarcação de propulsão nuclear. Usa o distintivo de golfinho. E tem a audácia de estar aí parado, me perguntando o que é ‘Fantasma Cinco’?”

Price estava tremendo. “Senhor… eu… não está nos manuais atuais…”

“Não, não é”, rugiu Thompson, e agora sua voz era um berro, assustando marinheiros a seis metros de distância. “Não está nos manuais porque é uma história que contam em sussurros no BUD/S! É o padrão que exigem de você quando está no meio da Semana do Inferno, congelando, e pensa que não vai dar mais um passo! Eles falam sobre ele.”

Ele apontou um dedo trêmulo para Silas.

“Eles te contam sobre a Operação Cinder Quill. 1968. Uma missão secreta tão profunda, tão confidencial, que quando deu errado, foi completamente negada. Uma equipe de demolição subaquática de cinco homens — a Equipe Fantasma — enviada para destruir um alvo a 320 quilômetros dentro do território inimigo. Eles foram emboscados na inserção. Eles foram… aniquilados.”

Os olhos de Thompson fitavam Price fixamente, mas ele falava para a sala inteira, sua voz carregada de uma espécie de reverência terrível.

“O relatório pós-ação, que li quando era um jovem aspirante, ficou lacrado por trinta anos. Dizia que a equipe estava perdida. Missão falhou. Caso encerrado. Mas três semanas depois… três semanas… uma patrulha de longo alcance captou um sinal. Um único operador, a 320 quilômetros congelados do local da emboscada. Ele estava quase morto. Estava sozinho. Mas a missão? A missão estava completa. O alvo foi destruído.”

Ele se aproximou de Price, sua voz voltando àquele sussurro gélido.

“Eles enviaram rastreadores. Cães de caça. Patrulhas inteiras. Por 23 dias, eles o caçaram. E por 23 dias, ele foi um fantasma. Viveu de raízes e insetos. Movia-se apenas à noite. Completou a missão sozinho, depois de ver toda a sua equipe morrer. E então caminhou 320 quilômetros de volta para as linhas amigas. Eu sei disso”, a voz de Thompson falhou um pouco, “porque, quando eu era um jovem alferes, fui designado para receber seu relatório oficial, a sós com ele, em seu leito de hospital. Ele é o padrão, Price. Ele é a medida de um homem. Estamos aqui, com este uniforme, porque ele esteve lá, naquela selva. Sua Medalha de Honra está guardada em um cofre no Pentágono.”

A sala estava completamente silenciosa. Marinheiros, caixas, até mesmo os estoquistas… todos estavam paralisados, com os olhos fixos no frágil senhor que acabara de tentar escolher uma lata de sopa.

Silas Kane ficou ali parado, com os ombros caídos e os olhos fechados, como se contar a história fosse um fardo mais pesado do que vivê-la.

Price havia… desaparecido. O homem que estivera ali momentos antes — arrogante, poderoso, no controle — simplesmente evaporou. O que restou foi uma casca oca e trêmula. Sua carreira, sua reputação, toda a sua autoestima… tudo incinerado em 60 segundos.

Ele abriu a boca. Um som baixo e patético saiu. “Eu… eu… eu não…”

“Você não fez o quê, Price?”, cuspiu Thompson. “Você não sabia? Não é sua obrigação saber. Sua obrigação é mostrar respeito. A todos os homens e mulheres que vestiram este uniforme antes de você. Você acabou de zombar de uma lenda viva, Tenente-Comandante. Você acabou de cuspir em um pedaço da história que você não é digno nem de ler.”

A humilhação de Price era física, um fedor no ar. Seus olhos percorreram o ambiente, procurando uma saída, mas ele estava preso pela multidão silenciosa e encarando-o. Ele olhou para Silas, o rosto uma máscara de desespero e fúria.

“Você… você poderia ter me dito”, ele sibilou, com a voz baixa e venenosa.

Silas Kane finalmente abriu os olhos. Olhou para Price, não com raiva, nem com pena, mas com uma profunda e cansada tristeza.

Ele sorriu, um sorriso minúsculo e comovente, uma curva delicada em seus lábios.

“Filho”, disse ele, com a voz rouca, mas clara. “Se um homem precisa lhe dizer o que fez… então ele não fez o suficiente.”

Esse foi o golpe final. Price simplesmente… desmoronou.

O Almirante Thompson colocou uma mão firme e protetora no ombro de Kane. “Venha comigo, meu velho amigo. Vamos tirar você daqui.”

Enquanto o Almirante guiava o velho mergulhador para longe, a multidão de marinheiros se abriu lentamente, criando um caminho. Foi um gesto espontâneo e silencioso de respeito. Quando Silas passou, jovens marinheiros, oficiais e experientes suboficiais… todos se puseram em posição de sentido.

Deixaram o tenente-comandante Price sozinho no corredor, um monumento à sua própria desgraça, afogado no silêncio.

[FLASHBACK: 1968, 23 DIAS DE INFERNO]

A água estava tão fria que era ácida. Não apenas fazia você tremer; queimava.

Silas Kane — Fantasma Cinco — prendeu a respiração, com os olhos ardendo por causa da água salgada, enquanto ele e os outros quatro membros da Equipe Fantasma deslizavam do interior do submarino para o oceano escuro como breu. A câmara de descompressão se fechou com um sibilo atrás deles, selando-os na escuridão.

“Equipe Fantasma, presença”, estalou a voz em seu fone de ouvido, quase um sussurro. “Fantasma Um, pronto”, disse o Tenente Marcus “Martelo” Riley, o líder da equipe. Ele era o pai protetor, totalmente focado no trabalho. “Fantasma Dois, pronto”, sussurrou “Doc” Jensen, o paramédico, o calmo que poucas horas antes falava sobre seu filho recém-nascido. “Fantasma Três, pronto”, respondeu “Sparky” Finn, o especialista em comunicações e demolições, que, por superstição, colava uma foto de seu cachorro em seu equipamento. “Fantasma Quatro, pronto”, grunhiu “Reaper” Chen, o batedor, um homem que se movia como fumaça e raramente falava. “Fantasma Cinco, pronto”, sussurrou Silas.

“Nós somos verdes. Saiam da frente”, ordenou Hammer.

Eles nadaram por três quilômetros na escuridão congelante, o único som sendo a própria respiração e o bater rítmico das nadadeiras. Isso representava 320 quilômetros dentro de território proibido. Ninguém viria resgatá-los. Era uma operação secreta.

Eles emergiram das ondas como criaturas das profundezas, largando seus respiradores Draeger na areia negra, armas em punho. A copa das árvores da selva era tão densa que engolia o luar.

“Dois microfones apontados para o alvo”, sussurrou Hammer, com a voz tensa. “Essa é a estação de radar costeira direcionando os bombardeiros para nossos navios. Plantamos o C4 e voltamos para a água. Sem contato. Movimentação silenciosa.”

Eles se moveram. Por uma hora, foram sombras. Eram os homens invisíveis, os operadores de pesadelo sobre os quais o inimigo sussurrava, mas nunca via.

Eles estavam a 500 jardas do objetivo quando aconteceu.

CLIQUE.

O som era minúsculo, metálico e catastrófico. Era o som de uma mina de placa de pressão.

Sparky, o Fantasma Três, congelou. “Estou cuidando disso”, sussurrou, com a voz repentinamente tensa.

“Não”, disse Hammer, com a voz em tom urgente. “É uma corrente. Eu ouço… eu ouço movimento.”

E então o mundo acabou.

Um holofote, mais brilhante que o sol, acendeu-se, prendendo-os num cone de luz branca intensa e aterradora. Gritos irromperam das árvores. “BỘ ĐỘI! BỘ ĐỘI!”

“CONTATO À FRENTE!” rugiu Hammer, abrindo fogo.

A selva explodiu. Ninhos de metralhadoras que eles não tinham visto despedaçaram as árvores. Traçantes, verdes e vermelhos, rasgaram o ar, uma treliça mortal e bela.

“Doc foi atingido!” gritou Reaper do flanco direito.

Silas se virou. O Dr. Jensen estava no chão, uma mancha escura se espalhando pelo seu peito. Ele tentava pegar seu kit médico, mas suas mãos tremiam.

“Eu o peguei!” gritou Silas, rastejando de volta pela lama.

“NEGATIVO, CINCO!” gritou Hammer, dando cobertura. “SPARKY, PREPARE A CARGA! REAPER, NA MINHA COSTAS!”

Silas o ignorou. Ele alcançou Doc. O homem estava se engasgando com o próprio sangue. O ferimento era um buraco do tamanho de um punho. “É… é grave, Ghost”, Doc murmurou, com um sorriso sangrento nos lábios. “Diga ao meu… diga ao meu garoto…”

“Não fale, eu te seguro”, disse Silas, com as mãos escorregando no sangue enquanto tentava estancar o sangramento.

“Silas!”, gritou Hammer, com a voz desesperada. “Eles estão nos flanqueando! Vá… vá atrás da missão…”

Uma granada propelida por foguete atingiu a árvore bem acima de Hammer e Reaper. A explosão foi ensurdecedora. A onda de choque foi como um soco, tirando o ar dos pulmões de Silas. Estilhaços, incandescentes, queimaram sua coxa como um atiçador de lareira.

Quando a fumaça se dissipou, onde Hammer e Reaper estavam… não havia nada. Apenas uma cratera e o cheiro de ozônio e cobre.

“NÃO!” gritou Sparky, levantando-se de joelhos e disparando sua arma em modo automático. “VOCÊ… SEU DESGRAÇADO—”

Outra metralhadora abriu fogo, abrindo uma linha de disparos no peito de Sparky. Ele foi arremessado para trás, com o dedo ainda no gatilho, disparando inutilmente contra o céu escuro até o carregador ficar vazio.

E então… silêncio.

Apenas o som dos soldados inimigos se movendo na mata. Os gritos de triunfo. E o som do próprio coração de Silas Kane, batendo tão forte que ele pensou que fosse explodir do peito.

Toda a sua equipe. Seus irmãos. Sumiram. Em trinta segundos.

Ele jazia atrás do corpo de Doc, sua perna gritando de dor, o mundo reduzido a lama, sangue e cheiro de cordite.

Receba a missão.

As últimas palavras de Hammer.

Uma fúria fria e pura inundou a dor. Ele olhou para o kit de demonstração que Sparky carregava. Estava a uns seis metros de distância.

Ele esperou. Diminuiu a respiração. Tornou-se a selva. Quando o primeiro soldado inimigo se aproximou, Silas não se moveu. O soldado cutucou o corpo de Doc com o rifle, a baioneta roçando o braço de Silas. Silas permaneceu completamente imóvel, prendendo a respiração, sentindo o sangue quente esfriar em seu rosto. O soldado grunhiu, satisfeito, e seguiu em frente.

Durante duas horas, Silas Kane ficou ali deitado, sangrando, ouvindo-os despojarem seus irmãos de suas armas e equipamentos.

Quando finalmente foram embora, ele começou a engatinhar.

Ele pegou o kit de demonstração. Rastejou até Doc e tirou as placas de identificação do pescoço dele. Rastejou até a cratera e cavou na terra até que seus dedos ensanguentados encontraram as placas de Hammer. E as de Reaper. Rastejou até Sparky e pegou as dele. Colocou os quatro conjuntos de placas em volta do próprio pescoço, o metal frio contra a pele.

“Vou te levar para casa”, sussurrou ele, com a voz embargada. “Mas primeiro… precisamos terminar o serviço.”

Nos 23 dias seguintes, ele foi caçado. A ferida em sua coxa infeccionou. Suas rações acabaram no segundo dia. Ele sobreviveu comendo larvas, cobras e água do rio, que o deixou doente. Movia-se apenas à noite, rastejando, caminhando, nadando. Tornou-se um rumor, um fantasma. Os rastreadores enviados atrás dele encontraram apenas um acampamento frio e uma única pegada. No terceiro dia, encurralado por uma patrulha, escondeu-se em uma vala séptica por 12 horas, respirando por um caniço oco, com a sujeira até o queixo.

No quinto dia, delirando de febre, ele alcançou o objetivo. Rastejou por baixo da cerca de arame farpado, passando pelos guardas arrogantes e entediados. Plantou os 23 quilos de C4 bem debaixo do nariz deles, as cargas acionadas com dedos trêmulos e ensanguentados. Programou o temporizador para 24 horas.

E ele começou a andar.

Ele caminhou por mais 18 dias. Caminhou 320 quilômetros, cada passo uma agonia, as placas de identificação de sua equipe tilintando suavemente contra seu peito, uma lembrança constante. Ele tinha alucinações. Ele via Hammer, caminhando ao seu lado. “Só mais um quilômetro, Ghost”, Hammer dizia. “Não desista de mim.”

No 23º dia, ele desmaiou perto do leito de um rio, seu corpo finalmente cedendo. Ele pesava 40 quilos. Ouviu o som fraco de um helicóptero Huey americano. Pegou seu rádio, aquele que ele havia protegido durante todo o tempo.

“Qualquer… qualquer estação… aqui é Ghost Cinco. Missão… cumprida.”

De repente, ele se viu em um hospital, e o Almirante Thompson, então um jovem e apavorado Guarda-Marinha, estava sentado ao lado de sua cama, com ordens para realizar o interrogatório oficial, confidencial e restrito a ele.

“Eles… eles se foram”, sussurrou Silas. “Mas a missão… está completa.”

[DIAS DE HOJE]

A história do “Fantasma Cinco” espalhou-se pela base naval como uma onda de choque.

Ao anoitecer, toda a base fervilhava de atividade. O nome de Price era pronunciado apenas com desprezo. O nome de Kane era pronunciado com uma reverência geralmente reservada aos mortos.

Naquela noite, no refeitório dos oficiais, o tenente-comandante Price estava sentado em sua mesa de canto de sempre. Sua refeição estava intocada. Ninguém se juntou a ele. Marinheiros e oficiais entravam, o viam e, deliberadamente, escolhiam uma mesa do outro lado do refeitório. Seu isolamento era total. Ele era um fantasma de outro tipo. Pedira transferência imediata. O pedido foi negado. Ele permaneceria ali, um monumento vivo à sua própria desgraça.

Enquanto isso, no pequeno alojamento temporário que lhe fora dado, Silas Kane sentou-se na beira do catre. Tirou a corrente de debaixo da camisa. Nela estavam suas próprias etiquetas de identificação e as de outras quatro pessoas, desgastadas pelo tempo.

Ele os apertou em seu punho nodoso.

“Eu carreguei vocês, meninos”, sussurrou ele na escuridão do quarto, lágrimas escorrendo por seu rosto marcado pelo tempo. “Eu carreguei vocês até aqui.”

Ele passara décadas enterrando os fantasmas. Vivera uma vida tranquila, nunca falando de Cinder Quill, nunca desejando reconhecimento. O confronto na troca de palavras lhe parecera uma violação, como se estivesse desenterrando os túmulos que cuidara em silêncio.

Mas o destino ainda não havia terminado com ele.

Na manhã seguinte, bateram à porta. Era o Almirante Thompson.

“Silas”, disse ele, com a voz estranhamente firme. Ele segurava um envelope formal, cor creme. “O Secretário da Marinha quer vê-lo. Em Washington.”

O coração de Kane acelerou, mas de pavor, não de orgulho. “Por quê?”, ele sussurrou roucamente. “Depois de todo esse tempo? Eu disse a eles… eu disse a eles que não queria…”

“Não se trata mais do que você quer, Silas”, disse Thompson gentilmente. “Trata-se do que a Marinha… do que o país… precisa lembrar.”

Quando chegaram ao Pentágono, a recepção foi surpreendente.

Enquanto caminhavam pelo “Salão dos Heróis”, generais e almirantes permaneciam em formação silenciosa. Não estavam ali por Thompson, mas sim por ele. Quando Silas Kane — curvado, grisalho, apoiando-se pesadamente em sua bengala — passou, esses homens poderosos, homens que comandavam frotas e exércitos, endireitaram-se e prestaram continência. Alguns apenas baixaram a cabeça em profundo respeito.

O velho mergulhador de combate havia se tornado um monumento vivo.

Numa sala privada, o Secretário da Marinha aguardava ao lado de uma maleta coberta de veludo.

“Sr. Kane”, disse o Secretário, com a voz embargada pela emoção. “Há honras que a história, e a sua própria humildade, lhe negaram. Já passou da hora de corrigir isso.”

Silas piscou, confuso, enquanto um auxiliar abria a maleta.

Lá dentro, brilhando sobre um leito de veludo azul, estava a Medalha de Honra. Aquela que lhe fora concedida em segredo, aquela que se recusara a aceitar publicamente, aquela que fora enterrada nos arquivos a seu próprio pedido.

“A América precisa se lembrar de seus heróis, Silas”, disse o Secretário. “Não os enterrar em silêncio.”

Ele pegou a medalha e a estendeu para ele.

Lágrimas brotaram nos olhos de Silas, espontâneas e incontroláveis. Seus lábios tremeram. “Eu não mereço isso”, sussurrou ele, com a voz embargada. “Eu falhei com eles. Eles se foram.”

O Secretário balançou a cabeça, com o olhar firme. “Você não usa isso por si mesmo, Silas. Você usa por Hammer. Por Doc. Por Reaper. Por Sparky. Você usa isso pela Equipe Fantasma.”

Ele colocou delicadamente a medalha e sua fita azul em volta do pescoço do velho.

Quando terminou, Silas saiu para o ar fresco de Washington, com a medalha inesperadamente pesada no peito. Repórteres estavam reunidos, a uma distância respeitosa. Ele os ignorou.

Em vez disso, ele olhou para os jovens marinheiros que faziam guarda na entrada. O futuro.

Uma delas, uma jovem não mais velha que dezenove anos, com o rosto expressando uma mistura de admiração e nervosismo, deu um passo à frente.

“Senhor?”, disse ela, com a voz trêmula. “Sr. Kane? Eu… eu só queria agradecer. Meu instrutor no treinamento básico nos contou sua história. O senhor… o senhor é o motivo pelo qual eu me alistei.”

Silas olhou para ela e, pela primeira vez, um sorriso genuíno surgiu em seus lábios. Ele colocou uma mão trêmula no ombro do jovem marinheiro.

“Então, certifique-se de viver pelos seus irmãos e irmãs”, disse ele, com voz firme. “Não apenas por você mesmo. Só assim este uniforme terá algum significado.”

Enquanto o sol se punha sobre a capital, Silas Kane finalmente sentiu algo que não sentia há décadas.

Paz.

Os fantasmas que o assombravam a cada instante de vigília, os quatro irmãos que carregara nas costas por meio século… pareciam mais leves. Como se tivessem sido reconhecidos, honrados e, finalmente, gentilmente, sepultados.

Ele não era apenas o Fantasma Cinco, sussurrava a lenda nas sombras. Ele era Silas Kane, um homem que levara a memória de seus irmãos para casa.

Quando embarcou no avião de volta à base, o Almirante Thompson sentou-se ao seu lado. “Você se arrepende agora, Silas?”, perguntou ele suavemente. “De ter voltado para a luz?”

Silas olhou pela janela enquanto o avião subia em direção ao céu que escurecia, com as luzes da cidade diminuindo lá embaixo.

“Não”, disse ele finalmente, com a voz firme. Ele ergueu a mão e tocou a medalha que repousava contra o peito.

“Porque agora… eles finalmente vieram para casa comigo.”

E com isso, o homem conhecido como Fantasma Cinco fechou os olhos e, pela primeira vez em cinquenta anos, permitiu-se descansar.

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