
Ao voltar para casa e encontrar seu filho recém-nascido chorando e sua esposa em frangalhos, Lawrence não está preparado para o que o aguarda no berço, nem para a verdade. Numa corrida contra o tempo e a traição, um pai precisa desvendar uma teia de mentiras para salvar o que lhe é mais precioso.
Meu nome é Lawrence. Tenho 28 anos e ontem meu mundo se abriu completamente.
Você sempre acha que vai saber quando algo está errado. Que seu instinto vai lhe dizer algo, que sua intuição vai entrar em ação.
Mas eu perdi essa oportunidade.
E agora vivo com o som dos gritos do meu filho recém-nascido gravado na minha memória.
Cheguei em casa pouco depois das seis da tarde. A porta da garagem rangeu atrás de mim como em qualquer outra tarde, mas antes mesmo de sair da sala, eu ouvi. Aiden estava choramingando em algum lugar dentro da casa. Não era o choramingo típico de um recém-nascido ou uma birra de cólica.
Foi aquele tipo de grito que chegava ao peito e apertava com força.
“Claire?” eu disse, largando a mochila do meu laptop na mesa do hall de entrada.
Não recebi nenhuma resposta.
Encontrei minha esposa sentada na ilha da cozinha, curvada e tremendo.
Seu rosto estava escondido entre as mãos. E quando finalmente olhou para cima, seus olhos estavam vermelhos e inchados.
“Meu Deus, Lawrence”, ela sussurrou. “Ele está assim o dia todo…”
“Ela passou o dia todo chorando ?”, perguntei, com o coração pesado.
“Sim, o dia todo”, disse Claire, com a voz trêmula. “Tentei de tudo. Dei de mamar, troquei a fralda, banhei. Fiz ele arrotar. Levei-o para passear no carrinho. Tentei música, o balanço, até contato pele a pele. Nada funcionou…”
Aproximei-me e peguei na mão da minha esposa. Estava fria e ligeiramente úmida, como se todo o calor tivesse sido drenado dela. Ela parecia exausta, mas não era apenas fisicamente.
Era algo muito mais profundo, como se algo dentro dele tivesse começado a se desfazer.
“Está bem”, eu disse suavemente, tentando concentrar nós dois. “Vamos ver o que acontece. Vamos descobrir isso juntos, meu amor.”
Enquanto caminhávamos pelo corredor, ele baixou a voz.
“Tive que sair do quarto”, ela sussurrou. “O choro… me afetou muito.”
“Parecia que estava entrando no meu crânio. Eu não aguentava mais. Precisava respirar.”
Virei ligeiramente a cabeça para observar sua expressão. Claire parecia… assustada. Não apenas com o que estava acontecendo com Aiden, mas com algo mais. Convenci-me de que era apenas cansaço.
Os recém-nascidos tinham o dom de fazer até as pessoas mais fortes desmoronarem.
Quando entramos no quarto do bebê, o som estava ainda pior. Os gritos de Aiden faziam as paredes vibrarem, rompendo o silêncio como estilhaços de vidro.
Sentia uma pressão no peito.
As persianas estavam abertas; a luz do sol entrava pelo berço, forte demais e quente demais. Atravessei o quarto e as fechei, tingindo o ambiente de um cinza suave e discreto.
“Ei, amigão”, murmurei, tentando manter a calma. “Papai está aqui.”
Inclinei-me sobre o berço e comecei a cantarolar, em voz baixa e familiar, a mesma melodia que cantara na noite em que ela voltou do hospital. Quando estendi a mão para o cobertor, esperando sentir o contorno de sua pequena figura por baixo dele, não senti… nada.
Puxei o cobertor. E paralisei. Não havia bebê nenhum.
No lugar do meu filho havia um pequeno gravador preto que piscava constantemente. Ao lado dele, um pedaço de papel dobrado.
“Espere! Onde está meu bebê?” Claire gritou, com a respiração ofegante.
Apertei o botão para parar o gravador. A sala ficou em um silêncio tão completo que meus ouvidos começaram a zumbir.
Com as mãos trêmulas, desdobrei o bilhete.
Meus olhos percorreram as palavras, e cada uma delas pareceu uma facada na minha espinha.
“Não! Não, não, não. Quem faria isso? Lawrence!” disse Claire, dando um passo para trás. “Ele esteve aqui! Aiden esteve aqui.”
“Eu avisei que você se arrependeria de ser grosseira comigo. Se quiser ver seu bebê de novo, deixe US$ 200.000 nos guarda-volumes perto do píer. Bilheteria 117.”
Se você contatar a polícia, nunca mais o verá. Nunca.
Claire deu um suspiro de espanto quando li o bilhete em voz alta. Ela abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu.
Encarei o papel e li-o novamente, desta vez mais devagar, embora as palavras já estivessem gravadas na minha mente. Meus dedos tremiam enquanto eu apertava a borda do bilhete.
Um zumbido encheu meus ouvidos e uma náusea começou a subir pelo meu corpo.
“Não entendo”, sussurrou Claire. “Quem faria isso? Por que alguém faria isso…?”
Não respondi imediatamente. Minha mente estava repassando as últimas semanas freneticamente, como numa busca desesperada por arquivos, e então, de repente, tudo fez sentido.
Duas semanas atrás. O hospital. O zelador.
“Acho que sei”, disse baixinho. “Chris, o zelador da maternidade. Lembra dele?”
Claire balançou a cabeça negativamente. Parecia que ia desmaiar.
“Eu derrubei sem querer um pote de biscoitos idiota em formato de urso enquanto ele limpava. Eu estava esperando para dizer a uma das enfermeiras que queria um pouco de creme. Ele me olhou como se eu tivesse insultado pessoalmente a linhagem dele. Ele disse alguma coisa… alguma coisa sobre eu me arrepender.”
“Você acha… que foi ele quem levou nosso filho?”, perguntou Claire, com os olhos arregalados.
“Não sei, Claire. Talvez? Mas ele é o único que chegou perto de ser uma ameaça.”
“Temos que ir à polícia”, eu disse, dobrando o bilhete e guardando-o no bolso do meu casaco.
“Não!” Claire estendeu a mão e agarrou meu braço. “Lawrence, não podemos. O bilhete dizia que se ligássemos para eles, nunca mais veríamos Aiden. Ele pode estar nos observando agora mesmo…”
“Não podemos ficar de braços cruzados, Claire”, eu disse de repente. “Nem sabemos se isso é real. E se for mentira? Se for ele, talvez consigam encontrá-lo. Esse homem pode ter feito isso antes. Precisamos de justiça. Precisamos do nosso filho de volta.”
“Não me importa se é mentira! Eu só quero nosso bebê de volta.”
“Por favor, Lawrence. Nós pagamos. Eu faço qualquer coisa que você quiser! Vamos conseguir o dinheiro. Vamos fazer isso!” gritou Claire.
A urgência dele parecia deslocada… algo parecia ensaiado. Mas eu não queria me deter muito nisso. Tentei não me deter.
“Está bem”, eu disse. “Vamos lá.”
Saímos para o banco em silêncio. Minha esposa estava encolhida no banco do passageiro, com os braços cruzados sobre o estômago. Ela olhava pela janela, sem foco, como se sua mente tivesse se desligado de tudo ao seu redor.
Ela parecia frágil, pálida, como se fosse se despedaçar com uma palavra errada.
Após dez minutos, ele se virou abruptamente.
“Pare. Agora mesmo.”
“O quê?” perguntei, já diminuindo o passo. “O que está acontecendo?”
“Estacione agora. Por favor”, repetiu Claire.
Desviei para o acostamento e mal consegui estacionar antes que ela abrisse a porta com um empurrão e tropeçasse na calçada.
Ele se abaixou e vomitou na vala, agarrando os joelhos com as duas mãos.
Saí para ajudá-la, mas ela fez um gesto com a mão para que eu a ajudasse.
Após a segunda parada, ele apoiou a cabeça no assento e fechou os olhos.
“Eu não consigo, Lawrence”, ela sussurrou. “Não consigo ir com você. Só de pensar nisso, já me dá vontade de vomitar de novo. Eu não consigo…”
Estudei isso por muito tempo.
“Quer que eu te leve para casa?”, perguntei a ele.
“Por favor. Só… façam isso sem mim. Consigam o dinheiro. E tragam nosso filho para casa são e salvo.”
Quando chegamos em casa, ajudei Claire a caminhar até a cama, a enrolei nos cobertores e beijei sua testa.
“Eu te ligo assim que souber de alguma coisa.”
Ele não respondeu. Seus olhos já estavam fechados e seu rosto estava virado para a parede.
De volta ao carro, tentei impedir que meus pensamentos se dispersassem. Concentrei-me na estrada, na minha respiração, na sensação do volante em minhas mãos.
No banco, solicitei um saque em dinheiro de grande valor. Os olhos da caixa se arregalaram quando lhe dei o valor.
“Sinto muito, senhor, não temos essa quantia disponível. Podemos lhe adiantar US$ 50.000 hoje. O restante precisará de um prazo de processamento.”
“Então me dê isso”, eu disse, mal conseguindo conter a tensão na minha voz. “Preciso disso imediatamente.”
A caixa assentiu com a cabeça e começou a processar o pedido.
“O senhor está com algum problema?”, perguntou ele educadamente. “Temos pessoas disponíveis para discutir isso…”
“Não, não”, eu disse, sem ter certeza se estava fazendo a coisa certa. “Eu só preciso fazer um pagamento com urgência. É por isso que preciso do dinheiro. Só isso.”
Teria sido mais sensato contar ao caixa o que realmente estava acontecendo?
Mas como eu explicaria que meu filho havia sido sequestrado do berço, enquanto sua mãe estava a menos de cinco metros de distância?
Eles trouxeram tudo em fardos, empilhados e amarrados com fita adesiva, como em um filme de assalto. Mesmo assim, parecia errado. Pequeno demais. Leve demais.
Mas deve funcionar.
Coloquei tudo dentro de uma mochila esportiva preta, fechei o zíper e fui para o cais, na esperança de que fosse o suficiente para me dar algum tempo.
Os armários ficavam em um corredor escuro atrás de uma loja de souvenirs, quase sem sinalização. Coloquei minha mochila no armário 117, tranquei-o e saí andando, optando por me esconder atrás de uma van de entregas estacionada.
Nem quinze minutos haviam se passado quando Chris apareceu.
O zelador aproximou-se dos armários vestindo uma camisa tie-dye e óculos de sol enormes, como se estivesse fazendo recados.
Ela nem olhou em volta. Caminhou até o armário, sacudiu o cadeado até abrir e pegou a bolsa.
Não tive outra escolha senão segui-lo.
Alcancei Chris assim que ele se virou perto das máquinas de venda automática no terminal. Não perdi um segundo.
“Onde está meu filho?” gritei, agarrando-o pela gola e prensando-o contra a parede de azulejos. A mochila da academia havia caído de suas mãos, e pude ver um leve brilho de reconhecimento em seus olhos.
“O quê? Não… Eu não sei do que você está falando!” ela gaguejou, com a voz embargada pelo pânico.
“Você levou meu filho”, sussurrei. “Você sabe exatamente do que estou falando. O armário, a mochila, o choro fingido… foi ideia sua?”
O zelador levantou as mãos em sinal de defesa.
“Eu não peguei ninguém! Juro. Me pagaram para mover uma mala. Recebi as instruções no meu armário no trabalho, junto com um dinheiro. É só isso que eu sei. Nem sei quem me contratou. Olha, eu sou faxineiro, faço qualquer coisa por um dinheiro extra. Me disseram para vir aqui e pegar essa mala no armário 117.”
Ele parecia apavorado.
Não aquele tipo de terror fingido e apavorado que alguém ensaia, mas um medo puro, suado e pulsante.
“Recebi ordens para deixar a bolsa no meu armário no trabalho… alguém iria buscá-la. Disseram-me para não abri-la.”
Sua voz embargou nas últimas palavras e, por um instante, hesitei.
Eu o deixei ir.
Antes que eu pudesse agir, olhei para trás, para Chris. Ele não havia se mexido. Estava paralisado perto dos armários, esfregando as mãos como se não soubesse o que fazer com elas. Caminhei lentamente de volta até ele.
“Você me contou uma coisa. No hospital. Você se lembra?”, perguntei, tentando manter a voz firme.
“O quê?” perguntou Chris, com um olhar desconfiado.
“Você murmurou alguma coisa. Depois que eu deixei cair o pote de biscoitos sem querer. Algo sobre arrependimento. O que você quis dizer?”
“Cara… eu não ia dizer nada. Não era da minha conta”, disse ele.
“Diga isso mesmo assim.”
Chris mudou de posição e baixou a voz.
“Naquele dia eu estava recolhendo o lixo na maternidade. Quarto 212, o quarto da sua esposa.”
Ele fez uma pausa. Seus olhos desviaram para o lado, evitando meu rosto enquanto falava.
“Entrei e a vi beijando um cara. Não foi só uma rapidinha. Foi… algo mais. Ela estava segurando o rosto dele. Ele estava com a mão nas costas dela. Foi de verdade.”
“Ryan?” perguntei, mas eu já sabia.
“Eu não sabia quem ele era na época. Mas aí o reconheci no corredor, rindo com uma das enfermeiras. Foi quando percebi que ele se parecia com você. Foi aí que tudo fez sentido. Ele é seu irmão, não é?”
Eu não disse nada.
“Eu não sabia o que fazer”, continuou Chris. “Eu só estava lá para levar o lixo para fora. Não falei com ninguém. Mas quando você esbarrou em mim, eu olhei para você e simplesmente escapou. Que você se arrependeria. Não disse isso como uma ameaça. Eu só… sabia.”
“Você deveria ter me contado”, eu disse, mas minha voz saiu rouca.
Ele olhou para mim com algo parecido com pena.
Você teria acreditado em mim?
Eu não respondi.
Foi então que o quadro completo começou a se formar. Nunca tinha sido um resgate. Era uma cortina de fumaça.
E, de repente, cada momento das últimas 24 horas começou a se encaixar.
A insistência de Claire para que não envolvessemos a polícia. O jeito como ela apertou a barriga, não de tristeza, mas de nervosismo. O fato de ela ter me implorado para ir sozinho.
O crescente distanciamento entre eles ao longo do último ano. E aquela discussão de meses atrás que ressurgiu sem aviso prévio: aquela em que ela disse, entre lágrimas e frustração, que não acreditava que eu pudesse engravidá-la.
O ar ao meu redor ficou frio.
Não perdi mais um segundo. Fui direto para o hospital e encontrei o Dr. Channing, médico do Aiden, no saguão, mexendo no celular perto das máquinas de venda automática.
“Lawrence”, ele sorriu quando me viu.
“Preciso da sua ajuda”, eu disse com urgência. “Ligue para minha esposa. Diga a ela que você estava revisando alguns resultados e que há uma emergência com o Aiden. Diga a ela que precisa vir imediatamente.”
“Por quê?”, perguntou ele. “Não vou mentir até saber a verdade.”
Contei-lhe tudo, inclusive como meu próprio irmão foi cúmplice no sequestro do meu filho.
Vinte minutos depois, ela chegou. Claire entrou pela porta com Aiden nos braços… e Ryan, meu irmãozinho, ao seu lado.
Vê-los juntos me deixou sem fôlego.
Pareciam uma família entrando junta em um lugar.
Permaneci nas sombras por mais um tempo, com as mãos cerradas em punhos. Quando dei um passo à frente, fiz um pequeno sinal para os dois policiais com quem havia falado antes. Eles não eram do FBI, apenas dois policiais locais que me levaram a sério.
Eles se aproximaram sem hesitar.
“Os dois detidos permanecem sob custódia por sequestro”, disse um policial, colocando-se entre eles.
“Espere! Ele está doente! Ele precisa de atendimento médico! Eu sou a mãe dele…” gritou Claire, protegendo Aiden com os braços.
“Não”, eu disse, aproximando-me. “Ele está perfeitamente saudável. Eu só pedi ao Dr. Channing para mentir para que você o trouxesse aqui. Você fingiu… tudo .”
Ryan baixou o olhar, recusando-se a me encarar.
“Você não entende”, ela disparou. “Ryan e eu nos amamos há anos. Muito antes de você tentar me dar um filho e falhar. Aiden… ele não é seu.”
“Então por que você continuou casado comigo?”
“Porque você era confiável”, disse ela sem rodeios. “Você tinha o emprego, a casa e era responsável.”
“Você fez Aiden passar por meu filho.”
“Não achávamos que isso importasse, Lawrence. A criança precisa crescer com dinheiro. Você tem. Íamos pegar os 200 mil dólares e começar nossa vida juntos.”
“Eu não conseguia mais fingir que te amava”, disse minha esposa.
“Então você não apenas mentiu. Você queria me roubar. Meu filho… e meu dinheiro”, eu disse, respirando fundo.
“Ele não é seu filho, Lawrence”, disse Claire, com o maxilar cerrado.
Olhei para Aiden, que chorava em seus braços.
“De acordo com a certidão de nascimento dele, sim, Claire. Eu sou o único pai que ele terá, e não vou deixar nenhum de vocês machucá-lo novamente.”
Um policial separou Aiden de sua mãe.
Os policiais afastaram Claire enquanto ela gritava algo mais, mas eu não a ouvi. Não mais. Eu só tinha olhos e ouvidos para o meu filho.
Seus gritos não eram mais de pânico ou agudos. Agora eram gemidos suaves, cansados e incertos que despertaram algo primitivo em mim. Dei um passo à frente e o segurei delicadamente em meus braços. Ele estava quente, mais leve do que eu me lembrava, e se agarrava ao tecido da minha camisa com uma força que desmentia seu tamanho.
“Ei, amigão”, sussurrei, embalando-o suavemente. “Você está bem. Papai está aqui.”
Ela se mexeu e apoiou a cabeça na minha clavícula, como se também se lembrasse de mim. Seu corpo relaxou e o choro cessou.
O Dr. Channing apareceu ao nosso lado.
“Vamos dar uma olhada rápida nele, Lawrence”, disse ele. “Só para ter certeza de que ele está bem.”
Assenti com a cabeça e o segui pelo corredor, ainda abraçada a Aiden.
Aconteça o que acontecer, eu não ia deixá-lo ir. Nem agora, nem nunca. Nunca.
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